A Voz Silenciosa

valter almeida • 6 de outubro de 2024

A Voz Silenciosa

Capítulo 1: O Primeiro Sonho

Era uma madrugada silenciosa. Lucas se revirava na cama, os olhos fechados com força, enquanto sua mente atravessava um labirinto de sombras e fragmentos. Havia algo ali, em algum lugar profundo de sua mente, algo que ele sabia não poder tocar diretamente. Mas sentia. Sentia como uma presença constante, à espreita.

No sonho, ele caminhava por um corredor sem fim, as paredes feitas de espelhos que refletiam uma versão distorcida de si mesmo. Suas roupas mudavam a cada passo. Ora um terno elegante, ora o pijama amarrotado que usava na vida real. Mas o mais perturbador eram os rostos. No reflexo, ele via seu próprio rosto, mas também os de pessoas que ele não reconhecia, rostos apagados, como se a memória delas estivesse incompleta.

De repente, uma porta apareceu à sua frente. Uma porta pesada de madeira escura, com um trinco enferrujado. Sem pensar, ele a empurrou. Atrás dela, um quarto vazio, exceto por uma única cadeira no centro. Sentado nela, um garoto, de costas para Lucas. O menino usava um chapéu de lã cinza e segurava algo nas mãos, que Lucas não conseguia distinguir.

Ele tentou chamar o garoto.

— Quem é você?

Nenhuma resposta. O garoto continuava imóvel, o chapéu cobrindo parte de seu rosto. Então, algo peculiar aconteceu. O ambiente ao redor começou a se desintegrar, como tinta derretendo de uma tela. Tudo, menos o garoto e a cadeira. Em meio ao caos, Lucas deu um passo à frente. No instante em que sua mão tocou o ombro do menino, ele acordou.

Sua respiração estava acelerada. O relógio ao lado da cama marcava 3h23. Ele passou a mão pelo rosto, ainda confuso. Aquela sensação de familiaridade, aquela inquietação… já havia sonhado com aquilo antes. Mas por quê? E quem era aquele garoto?

Lucas não conseguia mais dormir. Sentou-se na cama, tentando organizar os pensamentos. Como psicólogo, ele sabia que sonhos eram manifestações do subconsciente, mas aquilo parecia mais do que um simples sonho. Havia algo ali, algo que precisava ser entendido.

Na manhã seguinte, no consultório, ele tentou se concentrar em seus pacientes, mas as imagens do sonho continuavam a persegui-lo. O rosto do garoto, embora encoberto, parecia carregar um segredo que implorava para ser desvendado.

Lucas sabia que teria que enfrentar isso, mas onde começaria? Um sonho assim não era coincidência. Algo do passado parecia estar tentando emergir, e ele estava determinado a descobrir o que era — mesmo que isso o levasse a confrontar as partes mais sombrias de sua mente.

Conforme o dia avançava, uma ideia surgiu em sua cabeça: E se essas mensagens fossem mais do que simples recordações reprimidas? Talvez houvesse algo, uma verdade escondida, que seu subconsciente não estava apenas revelando, mas também tentando protegê-lo de descobrir.Na psicologia, os sonhos são amplamente interpretados como manifestações do subconsciente, uma janela para nossos desejos, medos e memórias reprimidas. Sigmund Freud, o pioneiro da psicanálise, acreditava que os sonhos revelavam desejos inconscientes, frequentemente ligados a impulsos reprimidos ou traumas que nossa mente consciente não permite vir à tona de maneira direta. Carl Jung, outro renomado psicólogo, tinha uma visão complementar, argumentando que os sonhos são uma forma de comunicação com o "inconsciente coletivo" e representam símbolos arquetípicos compartilhados por toda a humanidade.

Na história fictícia "A Voz Silenciosa", o sonho de Lucas pode ser interpretado dentro dessa linha de pensamento como uma manifestação de um trauma ou lembrança reprimida, que ele não consegue acessar de forma consciente. A figura do garoto no sonho poderia simbolizar uma parte de si mesmo — talvez sua infância ou uma memória antiga — que ele reprimiu por algum motivo. A porta no corredor, o quarto vazio, e a cadeira no centro, poderiam ser símbolos do isolamento e do desejo de reaver algo perdido.

No campo da psicologia cognitivo-comportamental (que é a área de atuação de Lucas, sendo ele psicólogo), os sonhos podem ser vistos como reflexo de pensamentos, emoções e padrões comportamentais diários. O sonho pode estar sugerindo que Lucas está lidando com algum conflito interno ou uma preocupação que ele ainda não conseguiu resolver. A presença constante de espelhos pode simbolizar uma necessidade de introspecção ou autorreflexão — ele está, literalmente, se confrontando no sonho.

O aspecto central desse tipo de análise seria o papel do inconsciente em sinalizar questões que precisam ser resolvidas. O subconsciente usa os sonhos como um canal para comunicar informações que estão bloqueadas ou não processadas adequadamente pelo consciente. O sonho de Lucas sugere que ele pode estar à beira de descobrir algo importante sobre si mesmo ou sobre um evento do passado.

Em uma consulta psicológica, o terapeuta poderia explorar esses elementos simbólicos com Lucas, ajudando-o a associar essas imagens com experiências, medos, ou situações de sua vida real, para trazer à tona o que o sonho está tentando comunicar.


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